terça-feira, 1 de junho de 2010

31/5 - Levando um "baile" da bicicleta!

31/05
Albergue Carnival, Cidade do Cabo, 23h
tempo: ensolarado, delicioso (dia), friozinho gostoso (agora)
bicicleta: 14km

Foi um dia super-proveitoso. Sofri um bocado, mas no final deu tudo certo. Fiz uma porção de coisas...
Acabo de pagar o albergue até o dia 7. No primeiro andar tem um bar, com música ao vivo – uns rapazes da Namíbia, tocando um rock antigo... Acabam de tocar “Woman don´t cry”. E agora, “Hotel California”, dos Eagles... bem apropriado! Para quem está lá no bar, deve estar um pouco alto, mas aqui em cima o som até que chega gostoso... estou economizando pilhas do rádio!


Cheguei! (ontem, 20h)
A viagem até a Cidade do Cabo foi uma das mais tranquilas da minha vida... não passei por nenhuma aventura, e a chinesinha do meu lado não parecia querer conversa... nem eu, pois estava bem cansado.
Conversa boa tive com o motorista da van que me trouxe do aeroporto até o albergue, o Zama, um moçambicano que veio pequeno para cá, e por isso tem alguma dificuldade com o português. Ele foi muito simpático, ao contrário dos outros 3 passageiros da van. Como fui o último a desembarcar, pude dar fitinhas só para ele – foram 5, pois ele tem esposa e 3 filhos pequenos. Mais 5 torcedores para o Brasil!
O albergue fica a menos de 2km do centro do Cabo, numa região de bares frequentados por jovens. A recepção fica no primeiro andar – meu quarto, no terceiro. Elevador? No way! Carreguei mochilas e sacola da bicicleta no muque!
Mas tenho um quarto individual, de frente, com pia com água quente! O banheiro, coletivo, fica bem em frente... e parece que não tem muita gente no andar. O recepcionista, Bardin, é jovem e simpático... para mim, parece australiano. Mais uma fitinha...
Antes de dormir, arrumei as coisas das mochilas no armário, e tirei fotos dos 2 quadros do quarto: ambos com gravuras de bicicleta!!!

Inabilidade manual (10h)
Estava com o sono bem atrasado. Na viagem, tinha dormido só umas 3h.
Mal acordei (às 10h), e antes mesmo de ir ao banheiro tirei a bicicleta da sacola. Estava super ansioso para montá-la. Nas viagens pelo Brasil, eu raramente a desmonto... quando muito, tiro a roda da frente, o que já me dá algum trabalho, por causa do freio... Para o exterior, costumo levá-la dentro de uma caixa: além da roda da frente, são tirados os pedais, o selim e o guidão. Pior do que montar e desmontar é carregar a caixa e arrumar um lugar para deixá-la – na Alemanha, não fosse o meu mais que amigo Sergio Mukherjee – para guardá-la em seu minúsculo “apertamento”, ele quase teve que ficar do lado de fora – eu estaria em apuros. Desta vez, acabei comprando uma sacola, muito mais fácil de carregar e guardar... mas que me obrigou a tirar a roda de trás. Na verdade, a bicicleta foi desmontada na oficina em que mandei fazer uma revisão, e onde comprei a sacola.
A montagem da roda de trás é bem mais complicada, pois, além do freio, tem o bagageiro e a dificuldade da colocação das catracas na corrente. Eu nunca fiz isso antes!
Foi muuuuuito sofrido. Logo de cara, ao tentar colocar o guidão, acabei arrebentando um dos cabos... pensei que tivesse sido de um freio ou da marcha – o que teria sido um verdadeiro desastre – mas foi o do velocímetro eletrônico. Mesmo assim, fiquei bem chateado, pois sei a dificuldade de consertar isso – e não gosto de andar sem o velocímetro. A roda da frente deu o trabalho de sempre – sim, por causa do freio – mas consegui colocá-la. Agora, a de trás... Para começar, a corrente parecia ter dado um nó!!! Se eu não tivesse visto a desmontagem da bicicleta, juraria que a corrente estava estragada. Acho que gastei uns 20minutos até que a corrente ficasse OK. Nem sei como consegui. Mas o pior foi colocar a roda. O mecânico que desmontou a bicicleta me ensinou como colocá-la... só que, na oficina, a bicicleta estava pendurada no teto, de cabeça para cima. Sem esse suporte, eu tive que virá-la de cabeça para baixo... e tudo ficou diferente! Não tinha jeito... eu estive muito perto de desistir, e ir procurar alguma oficina por aqui para montá-la... aí me lembrei que ontem tinha visto uma bicicleta na recepção. Desci até lá, e tentei entender como a corrente deveria passar pela catraca... e bingo! a roda entrou no lugar certo!!! Ainda levei mais uma hora e meia para centralizar direitinho as rodas – ambas estavam pegando nos freios! O bagageiro levou mais uns 15minutos. O selim e o pedal direito foram tranquilos... mas o pedal esquerdo... estava rosqueando para o lado errado!!! No final, enchi o pneu traseiro... mas não consegui encher o dianteiro! Nem consegui consertar o velocímetro! Mas isso era o de menos. Bastava achar um posto, e – quem sabe? – uma loja de acessórios. Depois de quase 4h de demonstração explícita de minha total inabilidade manual, eu tinha superado um grande desafio!


Tarefas (15h)
Eram quase 15h quando saí do quarto com uma lista de tarefas, que fui cumprindo passo a passo:
- conseguir conexão na Internet – o albergue fornece conexão Wi-Fi, mas é paga – comprei R$5,00 de crédito com o recepcionista Bardin
- comprar um plug-adaptador para a tomada do meu quarto – por indicação do Bardin, achei numa loja a 50m daqui
- encher o pneu da bicicleta – também indicação do Bardin, enchi num posto a 2 quarteirões – mais 5 fitinhas para os simpáticos frentistas, com direito a foto deles!
- comprar um novo velocímetro – antes de completar meu primeiro quilômetro pedalado em terras africanas, com o maior cuidado com a mão inglesa, achei uma loja e oficina... velocímetro novo comprado e instalado, e mais 2 fitinhas distribuídas (em troca, ganhei um adesivo da oficina, que se chama "Revolution Cycles", com a cara do Che Guevara)
- ativar meu celular, no qual instalei o chip que recebi pelo correio, da FIFA, por ter comprado ingressos via Internet – Por aqui, há uma rede de lojas, Woolworths (acho que é inglesa) que lembra um pouco as Lojas Americanas. Lá encontrei uma seção de telefones. O funcionário, Jason, testou o telefone, e me explicou que para desbloqueá-lo eu teria que pagar mais de R$50,00 ... acabei comprando um aparelho por R$30,00, com chip e tudo. Comprei também R$15,00 de carga – só não usei ainda porque a bateria estava descarregada...
- descobrir onde pegar os ingressos que comprei pela Internet – descobri o lugar... mas aqui houve um bônus!!


Ingressos (18h)
Comprei, pela internet, no site da FIFA, 10 ingressos. Cinco deles – incluindo os jogos do Brasil – foram comprados no começo do ano – para estes, eu recebi uma carta, explicando que eu deveria retirá-los num escritório da FIFA, em uma das cidades-sede, apresentando a carta, o passaporte e o cartão de crédito utilizado na compra. Para os outros cinco (dentre eles, o do jogo de abertura, o mais caro!), nenhum aviso ou confirmação. Como não tenho comigo nada que prove que eu comprei esses ingressos, estava meio ansioso para resolver logo isso.
Na tal carta, há o endereço do escritório da FIFA aqui na Cidade do Cabo... mas não localizei a rua no mapa. Como os escritórios funcionam até as 18h, achei melhor deixar a tarefa de retirá-los para amanhã... mas iria, ao menos, tentar descobrir onde ele fica.
Ao sair da loja do celular, a primeira placa de rua que vi foi a da rua do escritório. Aqui, os nomes das ruas são bem sinalizados... mas os números, nem tanto! A numeração é como no Rio e em Santos – não costuma corresponder à metragem em relação ao início da rua... Eu lembrava que o número era 55... mas não estava conseguindo achar nenhum número. Quase desisti... até que vi uma placa indicando “Ticket Center”. Quando cheguei lá, a porta do escritório estava fechada, mas algumas pessoas estavam do lado de fora. Pelo meu relógio, eram 5 para as 6. Perguntei se já tinham fechado, e me disseram que estavam tentando falar com alguém, pois ainda não eram 6h! Brinquei, sugerindo que deviam voltar amanhã, depois das 9h15 (o horário de abertura é 9h). Aí apareceu um funcionário, abriu a porta, e os deixou entrar. Minha tarefa já estava cumprida – já tinha descoberto onde era o escritório – mas aproveitei para contar ao funcionário que estava preocupado por não ter recebido a confirmação de 5 ingressos, e ele me disse que bastava apresentar o cartão de crédito e o passaporte. Agradeci a informação, me despedi... e aí lembrei que eu estava com ambos! Amarrei correndo a bicicleta num poste, e entrei no escritório – fui o último do dia! Apresentei meu cartão, o funcionário o passou numa máquina... e nela apareceram os dados dos meus 10 ingressos!!! O funcionário apertou um botão, fez um comentário de que eu tinha feito boas escolhas... e em menos de 1 minuto eu estava com os ingressos na mão. Ainda brinquei – pedi para ele me arrumar um ingresso da final... e saí, feliz da vida, dizendo “I love South Africa!”
Ainda bem que isso tudo aconteceu bem rápido... por um engano, o cadeado da bicicleta não estava amarrado ao poste... a bicicleta estava totalmente solta...


V & A (19h)
Para comemorar o dia, fui dar uma volta no Victoria and Albert – por aqui, V & A – Waterfront. Pelo que já tinha lido no guia, esse seria o local mais badalado da cidade... e acho que é mesmo! Ele lembra muito as áreas portuárias americanas que conheço (Miami, Nova Iorque, São Francisco e Nova Orleans). Tem um cais para barcos de passeio – dali saem as barcas para Robben Island, a ilha onde Mandela esteve preso – além de restaurantes e um shopping center.
Beirando o cais, há uma ciclofaixa! Pedalei por ela, tirei uma foto dos últimos raios de sol que ainda estavam no céu, e, ao fazer uma curva... dei de cara com o novo estádio da cidade, que será utilizado na Copa – o Brasil pode jogar lá, se chegar à semifinal. Aí, lembrei que não tinha comido nada no dia inteiro!!!
Entrei no shopping! Ele é gigantesco e muito chique... Luis Vuitton, Hugo Boss, Guess... não tem Daslu, mas tem uma loja das... Havaianas!!! Um par, aqui, custa em torno de R$100,00! E muita gente compra!!!
Nas vitrines das lojas – especialmente nas de roupas – há uma profusão de itens alusivos à Copa! Muito mais que no Brasil!!! E, lógico, predomina por aqui o verde-amarelo – principalmente por causa dos Bafana Bafana – mas o Brasil não faz feio – é disparado o segundo país em visibilidade nas vitrines.
A maioria dos restaurantes fica virada para o cais dos barcos de turismo. Ali também tem uma área aberta, com um pequeno palco e uma arquibancada – foi instalado um telão, onde deverão ser mostrados jogos da Copa. Nesse espaço, também se apresentam artistas de rua – músicos, estátuas vivas...


Sax (21h)
Minha primeira refeição na África foi um tagliarini com molho napolitano, degustado à luz de velas, à beira-mar. Mas o que mais me agradou foi o fundo musical – canções antigas e românticas – clássicos como “My way” e “La vie en rose” – vindas de um delicioso saxofone.
Ao final do jantar, fui falar com o músico. E conheci uma figuraça!
Daniel é um senhorzinho de 66 anos. Nascido no interior da África do Sul, trabalhou numa mina de diamantes. Aprendeu a tocar sozinho uma velha flautinha metálica, da qual não se separa nunca. “Hoje não fazem mais isto... é tudo de plástico!”, ele diz com alguma melancolia. O repertório refinado ele adquiriu ainda menino, ouvindo o antigo gramofone manual de sua mãe.
Quando falei que era brasileiro, cantarolou “Garota de Ipanema”. Pediu desculpas por não tocá-la – o sax já estava guardado no estojo, pois ele tinha que ir embora um pouco mais cedo, porque ainda não se recuperou totalmente de uma forte gripe. Mas prometeu tocar noutro dia.
Perguntei se ele gosta de futebol. “I love it!”. Seu jogador favorito é Ronaldinho Gaúcho. Ficou muito decepcionado quando lhe disse que Dunga não o convocou. “Que pena!” – ouvi isso pela terceira vez, em apenas um dia de África!
E Pelé? “Oh, man, he is the best!” Pois é: ele “é” (e não “foi”) o melhor! E Maradona? “Who???” Precisou se esforçar para se lembrar de Diego. “Você não pode compará-lo a Pelé!”
Daniel tem 3 filhos. Não tem muito contato com eles. “Moram na cidade. Lá é muito agitado e perigoso.” Daniel mora ali perto, em Green Point, coladinho ao novo estádio. Vem ao V & A Waterfront todos os dias, onde toca das 7h às 9h da noite, ganhando uns trocados dos turistas que por ali passam, concorrendo com estátuas vivas e outros músicos mais “modernos” – mal ele parou de tocar, apareceu um grupo de percussionistas.
Prometi que vou voltar para ouvi-lo de novo. Estava já sem fitinhas na sacola – dei-lhe a do meu pulso. Ele abriu o maior sorriso, beijou a fitinha – “I love Brasil!” – e a colocou em seu pulso.
Ao se despedir, me fez prometer que não iria passar pelo centro da cidade à noite – não tive coragem de lhe dizer que meu albergue fica no centro! E eu pedi que ele prometesse que vai cuidar da gripe ainda não curada.
Acho que ganhei meu primeiro amigo aqui na África...

2 comentários:

  1. Miranda,
    já que você dá tanto destaque à parte das "fitinhas" que você distribui, coloque no início do 'post' "contadores" informando o 'número de fitinhas distribuídas no dia' e 'desde o início da viagem'. Que tal?

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  2. Boa idéia, Lúcio! Vou fazer isso!

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